quinta-feira, janeiro 06, 2005

Que te aconteceu soldado? Não voltaste a marchar neste campo de batalha. Acaso foste ferido? Sei que é noite, mas o maqueiro está vigilante. Vê como observa os feridos. Vê como te observa.
«Agarra-te, Daniel! Acho que vou conseguir aterrar».
O avião balança no ar, está quase, quase a chegar ao chão.
«Ohh!»
O avião de riscas vermelhas ganhou vida própria, se é para ir para a esquerda, começa a dar voltas sobre si mesmo, se é para aterrar, vira à direita.. Simplesmente, não é possível comandá-lo.
A luz vermelha não pára de piscar. Algo está errado.
«Não, Daniel, não posso ir à janela agora. Não vês que o avião está descontrolado!»
«Mas as asas...»
«Já disse que não posso agora!»
«Mas é um pássaro!»
«Que disparate é esse?»
«O avião é um pássaro! Não vês as asas? E o bico?!»
«Endoideceste foi? Deixa-te de brincadeiras e ajuda-me a aterrar antes que a Susana acorde.»
Mas Martinho não vai conseguir parar a tempo. O avião de grandes asas acaba agora mesmo de sobrevoar a cabeça da Susana. Se ao menos fizesse menos barulho. Vai acordá-la com certeza!
Susana levanta a cabeça da almofada.
«Bom dia, Susana!»
«Olá Martinho... Daniel».
Bonita e elegante, é uma mulher de 32 anos, com grandes olhos amendoados. Por sinal, estão ainda maiores neste momento. Hesita. O que é aquilo na mão de Martinho?
«Que fazem os dois?», questiona enquanto se levanta do sofá. Desde sexta feira que dorme na sala porque o quarto cheira a tinta.
«Eu bem te disse que ela não ia gostar», diz Daniel, e virando-se para Susana explica. «Eu quis libertar os pássaros mas o Martinho insiste que temos de ir de avião, porque só os podemos libertar no cimo da montanha. E eu expliquei-lhe que os aviões não voam tão alto quanto os pássaros. E quando começam a subir muito alto ficam descontrolados. E foi o que aconteceu. O avião ganhou asas e quis voar como um pássaro livre e já não consegui libertar os meus pássaros porque o Martinho deixou o avião sobrevoar a tua cabeça e foi aí que ele perdeu o controlo.»
Martinho sorri mas nada diz. Afinal, é apenas um avião de papel na sua mão.


Agora experimentem escrever esta história num autocarro enquanto as pessoas lêem curiosas. Simplesmente maravilhoso! E tudo isso culpa desse genial filme À Procura da Terra do Nunca que abriu a porta à fantasia.